sexta-feira, 26 de março de 2010

Gênio

Quando tive contato com o trabalho de William Blake na universidade, não tinha noção do grande autor que estava conhecendo. Lembro que o primeiro poema que li de sua autoria foi The Sick Rose (A Rosa Doente). Um poema super curto, porém intensamente tocante.



The Sick Rose


O Rose thou art sick.
The invisible worm,
That flies in the night
In the howling storm:

Has found out thy bed
Of crimson joy:
And his dark secret love
Does thy life destroy.

A Rosa Doente
Ó Rosa, estás doente.
O verme que vadia,
Invisível na noite
De uivante ventania:

Achou teu leito feito
De prazer carmesim:
Seu negro amor secreto
Dedica-se ao teu fim.


Nenhuma tradução consegue ter o mesmo efeito do texto original, mas de algumas versões que já vi, achei essa a melhor. Ao fazer a analogia de uma rosa com o amor, Blake insinua que assim como a rose o amor também está doente. No entanto, nenhum dos dois estão cientes dessa doença. Com esse poema pequeno e poderoso o poeta chamou minha atenção. Foi quando resolvi procurar mais sobre ele. Atualmente, ele é considerado um dos grandes nomes da literatura mundial. Porém, ele nem sempre foi visto assim. Ignorado pela maioria dos seus contemporâneos, o autor foi considerado louco por muitos.

Ao comprar seu livro The Marriage Of Heaven and Hell pude perceber a razão de toda essa rejeição. A maioria dos seus textos são fantasias e criações de um mundo particular de Blake. Ele não somente criou uma doutrina pessoal, como também, seu próprio universo e, de fato, inovou o cenário de sua época ao ilustrar seus próprios textos e criar pinturas com imagens que vinham desse seu mundo. Até então (século XVIII), artistas não passavam para os quadros suas visões privadas. No entanto, ele quebrou os padrões, pois além de artista era também um poeta.




Essa pintura chamada Ancient Of Days demonstra um pouco da visão do pintor. A figura do senhor é vista como Deus, porém esse é um deus próprio de Blake. O plano de fundo conota as trevas e ao redor do ancião percebermos algo parecido como fogo, dessa forma, interpreto a sua visão de um deus obscuro. Se observarmos bem as luzes que ele transmite para baixo parecem com trovões o que pode denotar, também, terror. Claro que minha interpretação dessa pintura - assim como também de sua poesia - está suscetível a discussões. Nunca saberemos de fato a intenção de um artista/escritor ao efetuar uma obra a não ser que ele a tenha dito.


Ao adquirir sua coleção de poemas intitulada Songs Of Innocence and Of Experience (Canções da Inocência e da Experiência) vi a importância social do seu trabalho. Na primeira parte do livro, como o próprio nome sugere, os poemas possuem um tom ingênuo e às vezes soam até como uma canção infantil. Já na segunda metade a sensação é de amadurecimento. O eu-lírico começa a indagar mais e questionar o por quê de certas coisas. Suas críticas iam além do cunho social e atingiam também o espiritual. Um dos seus poemas mais fortes e mais questionadores, na minha opinião, é The Tyger (O Tigre).

The Tyger
Tyger Tyger, burning bright,
In the forests of the night;
What immortal hand or eye,
Could frame thy fearful symmetry?

In what distant deeps or skies.
Burnt the fire of thine eyes?
On what wings dare he aspire?
What the hand, dare seize the fire?

And what shoulder, & what art,
Could twist the sinews of thy heart?
And when thy heart began to beat,
What dread hand? & what dread feet?
What the hammer? what the chain,
In what furnace was thy brain?
What the anvil? what dread grasp,
Dare its deadly terrors clasp!

When the stars threw down their spears
And water’d heaven with their tears:
Did he smile his work to see?
Did he who made the Lamb make thee?
Tyger Tyger burning bright,
In the forests of the night:
hat immortal hand or eye,
Dare frame thy fearful symmetry?



O Tigre

Tigre, tigre que flamejas
Nas florestas da noite.
Que mão que olho imortal
Se atreveu a plasmar tua terrível simetria?

Em que longínquo abismo, em que remotos céus
Ardeu o fogo de teus olhos?
Sobre que asas se atreveu a ascender?
Que mão teve a ousadia de capturá-lo?

Que espada, que astúcia foi capaz de urdir
As fibras do teu coração ?
E quando teu coração começou a bater,
Que mão, que espantosos pés
Puderam arrancar-te da profunda caverna,
Para trazer-te aqui?

Que martelo te forjou? Que cadeia?
Que bigorna te bateu? Que poderosa mordaça
Pôde conter teus pavorosos terrores?
Quando os astros lançaram os seus dardos,
E regaram de lágrimas os céus,
Sorriu Ele ao ver sua criação?
Quem deu vida ao cordeiro também te criou?

Tigre, tigre, que flamejas
Nas florestas da noite.
Que mão, que olho imortal
Se atreveu a plasmar tua terrível simetria?


Lido logo após The Lamb (Cordeiro) ele parece ter um efeito ainda maior. Ao se perguntar sobre a criação do tigre Blake consegue com maestria fazer com que o leitor questione a bondade do criador que o moldou - já que o poema sugere que o animal não foi concebido. Por quê o mesmo deus que fez uma criatura tão bela e pura como o cordeiro criaria também um ser tão perverso e traiçoeiro como o tigre? Se em The Lamb o eu-lírico faz essa indagação à respeito da criação e do criador somente para responder no final, em The Tyger ele não o ousa fazer. Isso é um sinal da maturidade que o eu-lírico adquire. Blake parece, então, revelar em seus poemas a transição que passou em sua vida

O cinema também fez referência à William Blake. Em The Dangerous Lives Of Altar Boys [2002] (Meninos de Deus) vemos Kieran Culkin representando um adolescente, Tim, que devido ao descaso dos seus pais precisa crescer precocemente. Ele e seus amigo, Francis, (Emile Hirsch) estudam em uma escola católica e, portanto, são repreendidos constantemente. Obviamente, William Blake é um dos seus autores/pintores favoritos devido ao seu caráter rebelde e transgressor. Em uma das cenas finais do filme vemos o personagem de Hirsch passar por algo que o faz amadurecer forçadamente. Essa transição é simbolizada enquanto o personagem lê o poema The Tyger.


Emile Hirsch e Jena Malone - a atriz que sempre se destacou em papéis de garotas problemáticas achou o papel ideal nesse filme.

Bem, aqui fica minha dica. Quem quiser conhecer mais sobre o cara faça um bom uso do google!

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